Caminhoneiro

 Claro! Aqui está a nova versão da crônica, com a parte do farmacêutico ampliada com mais falas, reações e pensamentos, deixando tudo ainda mais cômico e narrativo:



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Crônica: O Dia em que Peguei Chato na Estrada


Boa tarde, galera. Eram 13h15 daquele longínquo 27 de março de 2015. Eu estava em Tinget, quase na divisa com Lorena, interior de São Paulo, bem pertinho da Aparecida do Norte. Lugar de fé e, naquele dia, também de provação.


Tava ali na fábrica de vidro da GC, esperando pra carregar rumo a Palmas, Tocantins. Um parceiro meu apareceu querendo trocar a viagem – ele ia pra Foz do Iguaçu, achava que era fã do DJ Wagner ou coisa parecida. Eu ainda fiquei pensando na troca, mas minha cabeça já tava longe. Bem longe. Tava era lembrando de uma história que, olha... até hoje me dá vergonha de contar. Mas quer saber? Que se dane, vou contar.


Tudo aconteceu numa dessas paradas de estrada, no Porto de Paranaguá. Posto Farol, se bem me lembro – nem sei se ainda existe. O que existia, com certeza, era um banheiro. Mas não qualquer banheiro. Era o banheiro mais imundo que você possa imaginar. Tomar banho ali foi um desafio olímpico. Mas como caminhoneiro não escolhe luxo, fui.


Depois do banho, cueca branca nova – porque cueca branca é sinal de higiene, ou pelo menos é o que dizem. Eis que me bate uma dor de barriga. Daquelas. Entrei na casinha pra fazer o número dois. E ali, amigo, começou minha saga. A força era tanta que parecia que eu ia parir um dormente. A cara vermelha, o pescoço duro, o suor escorrendo. E nada. Só sofrimento e papel higiênico ruim.


Foi só quando acabei e olhei pra baixo que veio o susto: minha cueca tava... pintada de sangue. Gelei. Pensei:

"Ué, eu menstruei?"

Claro que não. Olhei melhor, fui ver o que era. E, rapaz... descobri que tava com chato. É, isso mesmo. Chato. Um monte de bichinho pequeno, preto, enfileirado ali no meio dos cabelos da virilha. Uma procissão de desgraçados.


Agora me diga: como explicar isso pra minha mulher? A Dona Valdete? Ela ia jurar que eu peguei isso com alguma mulher da estrada. Mas eu juro por tudo: foi no banheiro! Naquele banheiro dos infernos.


A primeira coisa que pensei foi: "Preciso de um milagre... ou de uma farmácia."


Fui até uma ali perto, farmácia pequena, balcão de madeira, parecia mais boteco do que estabelecimento de saúde. Atrás do balcão, um senhor calvo, de jaleco encardido e óculos com fita isolante na haste. O crachá dizia "Silvério – Farmacêutico Responsável". Trinta anos de balcão, no mínimo. Me aproximei como quem vai contar pecado pro padre.


— “Boa tarde... então... é pra um amigo meu…”


Ele nem piscou.


— “Aham. Que amigo?”


— “Um amigo... teve um probleminha, digamos... com uns bichinhos. Lá embaixo.”

Falei isso e apontei discretamente pro umbigo, tentando ser sutil.


O Silvério largou o jornal que lia e me encarou com aquele olhar de quem já viu de tudo.


— “Bichinho tipo o quê? Carrapato? Piolho? Pulga? Bicho-de-pé? Ou é chato mesmo?”

A palavra bateu seca, direta, como tapa na cara.


— “Talvez... seja chato.”


Ele deu uma risada curta, de quem reconhece um clássico.


— “Rapaz... deixa de onda. Esse 'amigo' é você, né?”


— “Olha, doutor, se fosse eu, o que eu teria que fazer?”


Ele deu a volta no balcão com um ar metido a detetive e disse:


— “Bom, primeiro... deixa eu ver a situação.”


— “O quê?”


— “Tem que ver. Diagnóstico ocular. Não dá pra adivinhar. Mostra aí.”


Gelei. Olhei pros lados. Tinha uma senhora comprando vitamina C e um rapaz olhando camisinha.


— “Aqui? Agora?”


— “Ué, quer ajuda ou não quer?”


Suspirei fundo, fui até o cantinho do balcão e baixei discretamente a calça. Ele botou os óculos de grau, se abaixou, examinou e soltou um assobio.


— “Rapaz... isso aqui é o que a gente chama de infestação grau três. Esses aqui já tão pagando IPTU na tua virilha.”


Me vesti correndo, morrendo de vergonha, suando frio. Ele voltou pro balcão anotando coisas num bloquinho.


— “Você vai fazer o seguinte: primeiro, raspa tudo. Tudo mesmo. Da cintura pra baixo, lisinho. Depois, vai usar esse sabonete aqui — Permetrina. Vai tomar banho com ele duas vezes por dia. Pomada antiparasitária, mais esse comprimido. E lava roupa, toalha, lençol. Lava até o cachorro, se tiver.”


Assenti, já me sentindo um piolhento de guerra. Ele ainda completou:


— “E ó, nada de passar essas maluquices que o povo fala, tipo tiner, querosene, ou criolina.”


— “Tarde demais.”


Ele arregalou os olhos:


— “Você passou?”


— “Tiner.”


— “Mas você é louco, rapaz? Aquilo é solvente industrial! Você quer morrer pelos ovos do chato?”


Dei de ombros, derrotado.


Ele riu.


— “Vai com fé, mas vai com cuidado. E avisa tua esposa. Melhor ouvir grito do que ficar com isso escondido.”


Saí da farmácia carregando uma sacolinha que parecia ter tijolo dentro, e um peso na consciência maior ainda.


Cheguei em casa, pedi a gilete pra Valdete. Ela, desconfiada:


— “Ué, pra que isso?”


— “Depois eu explico. Só me ajuda aqui a fazer o corte 15 pra três.”


Raspei tudo. Passei pomada, sabonete, fiz o tratamento direitinho. Mas ainda tinha o pessoal que jurava que curava era com criolina, tiner, ou até fogo. Um doido falou:


— “Passa querosene, ué!”


Outro:


— “Tiner, irmão, tiner resolve!”


Na ignorância e no desespero, experimentei. Passei tiner. Quando pegou nas peles moles ali, meu irmão, parecia que eu tinha sentado num formigueiro em chamas. Ardia mais que pimenta no olho.


Mas sobrevivi. Fiquei lisinho igual pêssego de feira. Aprendi a lição: nunca mais sentar direto na tábua alheia, e sempre conferir o ambiente antes de dar confiança.


Hoje eu dou risada. Mas olha, foi constrangedor. Foi triste. Foi ardido. E, acima de tudo, foi verdade.


Então, se um dia você ouvir alguém dizer que “pegou chato na estrada”, respeita, viu? Que o sofrimento é grande – tanto na pele quanto na vergonha.



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Se quiser, posso adaptar essa crônica pra ser contada em formato de áudio, vídeo, ou transformar em stand-up. É só falar!


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