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Vestiário dos Rústicos
Na ala mais escondida da Santa Casa, onde ninguém passa sem motivo e poucos têm coragem de entrar, fica o lendário vestiário dos rústicos. Ali, longe dos corredores assépticos e das conversas sussurradas dos médicos, reina um mundo à parte — suado, barulhento e, acima de tudo, autêntico.
O vestiário tem um chuveiro que nunca esquenta direito e um banheiro individual que, embora tenha porta, jamais garantiu privacidade. Os sons — ah, os sons — atravessam a madeira como se fossem recados do além. Quem se aventura ali sabe que vai ouvir de tudo: arrotos, peidos, gemidos de esforço, e às vezes até gritos abafados de alívio.
Quem frequenta aquele reino são os chamados rústicos, apelido carinhoso (ou nem tanto) dado aos funcionários da manutenção, da coleta, motoristas e porteiros. É um espaço masculino, bruto e sem filtro. Um lugar onde apelidos valem mais que crachás, e onde a intimidade se mede pelo número de vezes que alguém já te viu saindo com o papel higiênico na mão.
Entre todos, quatro figuras se destacam — lendas vivas, cada uma com sua própria mitologia:
Odair, o Cagão
Baixinho, branquelinho e sempre com a chave de fenda no bolso, Odair é técnico de manutenção. Seu apelido não veio à toa: ele caga três vezes por dia, todo santo dia, sem falhar. E não são cagadas comuns. São eventos. Quando ele fecha a porta do banheiro, todos do vestiário olham uns pros outros em silêncio, já sabendo o que está por vir. Cinco minutos depois, o ambiente fica inabitável. Há quem diga que o azulejo chega a suar.
"Odair foi de novo", murmuram os colegas, abanando a camisa com as mãos.
Ricardo, o Barulhento
Alto, branco, porteiro das antigas. Usa botinas que fazem mais barulho que ele mesmo — o que é dizer muito. Quando Ricardo entra no banheiro, é como se um trovão se anunciasse. Primeiro vem o ranger das botinas no piso, depois o som da tampa do vaso batendo. E então... o espetáculo: um concerto de rajadas e respingos, como se houvesse guerra lá dentro.
"Esse toma café com dinamite", dizem os outros, rindo entre caretas.
João, o Tripé
Motorista corpulento, pele negra e sorriso fácil. Sempre tem uma história boa pra contar, mas o que realmente alimenta as conversas de bastidor é outra coisa. João ganhou o apelido de Tripé depois de um boato que escapou de um plantão noturno, e nunca mais perdeu o título. Ninguém confirma, ninguém nega — mas os olhos curiosos de novos colegas sempre buscam a prova quando ele passa de toalha.
"Já viu o Tripé no chuveiro? Parece que tá levando uma perna extra."
Lucas, o Amendoim
Coletor jovem, loirinho e baixo. Parece inofensivo, até passar pela primeira inspeção oral dos veteranos. Dizem que o apelido vem da surpresa: pequeno por fora, desproporcional por dentro. Uma espécie de “pequeno notável” do vestiário.
“Esse é tipo amendoim japonês: a casquinha engana.”
O vestiário dos rústicos não está em nenhum mapa da Santa Casa. Ninguém recomenda a visita. Mas ali, entre sons desconcertantes, piadas internas e segredos mal escondidos, pulsa a alma de um tipo de trabalhador que não aparece em fotos oficiais. São eles que fazem a engrenagem girar — suados, escrachados, barulhentos. Rústicos, sim. Mas indispensáveis.
Se quiser posso escrever uma continuação com uma situação cômica ou até uma visita inesperada que muda a rotina deles. Quer?
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