Caiso

 

rte 8: A Maldição da Dobradinha

Depois do voo fatídico no teco-teco e o episódio histórico do tupperware, os quatro rústicos juraram que nunca mais iam sair da Santa Casa juntos.

Juraram.

Mas como toda promessa entre homem crescido e sem noção, durou pouco. Três semanas depois, João apareceu com outra “oportunidade imperdível”:

— Um amigo meu tem rancho no rio. A gente vai de carro, dorme em rede e pesca de canoa. Coisa de homem raiz. Sem avião, sem frescura, sem civilização.

— Tem banheiro? — perguntou Odair, já com o trauma do tupperware impresso na alma.

— Tem o mato. Melhor que avião, não é?

— Já tô levando folha de bananeira — respondeu Ricardo, animado.

Lucas, o Amendoim, hesitou. Mas quando soube que iam levar um isopor só de cerveja e carne, topou.

Só esqueceram de combinar o cardápio do jantar.


A Dobradinha Assassina

No acampamento, enquanto montavam rede e montavam a churrasqueira, João puxou a panela de pressão como se fosse um tesouro:

— Trouxe dobradinha caseira, feita pela minha tia. Temperada ontem, geladinha. Vai ferver e comer na beira do rio.

— Dobradinha? — perguntou Lucas, desconfiado.

— Tripa com feijão branco. Proteína pura. E fibra. MUITA fibra.

Ninguém quis ser o fresco do grupo, então todos comeram. Dois pratos cada. Uns até repetiram. A cerveja ajudava a empurrar.

O problema é que a dobradinha já tinha vencido o prazo de validade do afeto da tia do João.


O Começo do Fim

Às 4h da manhã, os quatro já estavam dentro da canoa, remando no silêncio do amanhecer, quando o primeiro barulho estomacal ecoou na névoa.

GRUUGGGGGLLL

Lucas olhou para Odair.

— Foi você?

— Não... foi eu também.

Ricardo largou o remo.

— Gente... deu ruim.

João, pálido, parecia já ter tido um derrame interno.

— A dobradinha... tá querendo sair por todos os buracos.

E então o caos começou.


A Canoa da Agonia

O rio era largo, e a margem estava longe. A canoa, pequena. Não tinha banheiro. Não tinha arbusto. Não tinha nada. Só quatro corpos desesperados, suando, tremendo e cada um com sua emergência gastrointestinal.

Odair foi o primeiro. Já treinado no improviso, se levantou, abaixou a bermuda, agarrou na lateral da canoa e fez a clássica posição de agachamento flutuante.

— SEGURA A CANOA! TÁ VINDO!

PLLOOOFF SPLASH GLUB

Lucas começou a tossir. Ricardo gritou:

— TU CAGOU NO RIO, ANIMAL! EU VOU PESCAR COM ESSA ÁGUA!

Mas mal terminou de falar e pale face Ricardo virou de lado na canoa e vomitou o que parecia um pedaço inteiro de dobradinha semi-digerida.

João, suando, só dizia:

— Eu não vou conseguir segurar... Eu... não...

E se jogou na água. Literalmente pulou da canoa com a bermuda no joelho.

— EU VOU CAGAR NADANDO!

— MEU DEUS — gritou Lucas — ELE VIROU UM JATO HUMANO!

A água borbulhava. Peixes fugiam. A natureza se calava diante do terror.

E foi então que Lucas perdeu toda a força nas pernas.

— Ai não... não... não dá mais...

Sem tempo, tirou o boné da cabeça. Era a única coisa que tinha.

— LUCAS NÃO—
— DESCULPA! FOI O BONÉ OU AS CALÇAS!

E ele fez. Ali mesmo. No boné. Com lágrimas e vergonha. Mas fez.


A Volta do Inferno

Quando voltaram para o acampamento, parecia que tinham voltado da guerra.

João com o cabelo cheio de folha, Odair de cueca molhada, Ricardo pálido como um frango congelado, e Lucas com o boné amarrado em um galho de árvore, a dez metros da barraca.

O silêncio era respeitoso. As almas estavam quebradas.

Até que Ricardo disse:

— Eu vou ligar pra Vigilância Sanitária. Essa tia do João é um risco biológico.

Odair completou:

— E essa foi a última vez que eu cago em movimento. Quase perdi a cueca no rio.

Lucas, olhando pro horizonte, murmurou:

— Eu enterrei meu boné. Em breve, os peixes vão usar como abrigo.

João apenas sussurrou:

— A gente não pescou nada... mas largamos tudo.


Epílogo: De Volta ao Vestiário

Na segunda-feira, o vestiário estava em festa.

— E aí, como foi a pescaria? — perguntou Claudinei, o Filosofal.

Os quatro se entreolharam. Não falaram nada. Só assentiram, com um olhar de trauma compartilhado.

No fim da tarde, alguém pendurou uma plaquinha de papelão acima do espelho:

“Proibido comer dobradinha antes de embarcar.”

Assinatura?
Os Rústicos.


Quer que o próximo capítulo mostre eles sendo convidados pra dar uma palestra motivacional sobre “trabalho em equipe” na Santa Casa? Ou você tem outra ideia absurda e maravilhosa em mente?


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